H.D. Thoreau

“Não tente tão ansiosamente se desenvolver, nem se submeter ao efeito de muitas influências; é pura dissipação. A humildade, como a escuridão, revela as luzes celestiais. As sombras da pobreza e da crueldade se acumulam à nossa volta, “e, vejam!, a criação se revela aos nossos olhos”. Somos muitas vezes lembrados de que se nos fosse concedida a riqueza de Creso, rei da Lídia, nossos objetivos deveriam continuar sendo os mesmos, e nossos gastos, essencialmente os mesmos. Mais ainda, se você é constrangido em suas possibilidades pela pobreza, se não pode comprar livros e jornais, por exemplo, você se limita às experiências mais significativas e vitais; você é obrigado a lidar com o material que contém mais açúcar e mais amido. A vida é mais saborosa perto do osso. Você fica imune à frivolidade. Ninguém perde nada em um plano inferior por sua magnanimidade em um plano superior. A riqueza supérflua só compra supérfluos. Não é preciso dinheiro para comprar uma necessidade da alma.

Moro no ângulo de uma parede de chumbo, em cuja composição se acrescentou um pouco de bronze de sinos. Muitas vezes, no repouso do meio-dia, chega aos meus ouvidos um confuso tintinnabulum lá de fora. É o alarido dos meus contemporâneos. Meus vizinhos me contam de suas aventuras com cavalheiros e damas famosos, que sumidades encontraram à mesa do jantar; mas essas coisas me interessam tanto quanto o conteúdo do Daily Times. O interesse e a conversa giram principalmente em torno de boas roupas e bons costumes; mas um ganso ainda assim é um ganso, não obstante o modo como você o prepare. Eles me contam sobre a Califórnia e o Texas, sobre a Inglaterra e as Índias, do ilustríssimo senhor… da Geórgia ou de Massachusetts, todos fenômenos passageiros e fugazes, até o momento em que estou prestes a sair correndo daquele quintal, como bei mameluco. Adoro voltar a mim mesmo – não caminhar em procissão com pompa e ostentação, em lugar de destaque, mas caminhar de igual para igual com o Construtor do universo, se possível, não viver nesse século XIX irrequieto, nervoso, agitado e trivial, mas parar ou sentar pensativamente enquanto ele passa. 

O que as pessoas estão comemorando? 

Estão todos em algum comitê de preparativos, e de hora em hora esperam um discurso de alguém. Deus apenas preside aquele dia, e Webster é seu orador. Adoro ponderar, pesar, gravitar em direção àquilo que me atrai com mais força e legitimidade – não tentar me pendurar na travessa da balança e tentar pesar menos, não supor uma situação, mas agir na existente; percorrer o único caminho possível para mim, e no qual nenhuma força poderá me deter. Não me dá nenhuma satisfação começar a construir o arco antes de ter uma fundação sólida. Não vamos brincar no gelo fino. Há um leito sólido em toda parte. Lemos que o viajante perguntou ao menino se o pântano diante deles tinha fundo firme. O menino respondeu que tinha. Mas então o cavalo do viajante afundou até a cilha, e ele disse ao menino: “Pensei que você havia dito que o charco tinha fundo firme”. “Ele tem”, respondeu o menino, “mas o senhor ainda não chegou nem na metade do caminho até onde começa a ficar firme.” Assim é também com os pantanais e as areias movediças da sociedade; mas só um menino crescido sabe disso. Apenas aquilo que é pensado, dito ou feito com uma certa coincidência rara é bom. Não sou daqueles que insensatamente batem um prego no mero gesso com ripas da parede; tal atitude me deixaria sem dormir por noites a fio. Dê-me um martelo, e deixe que eu tateie até encontrar a viga. Não confie no reboco. Bata um prego até o fim e entorte a cabeça com confiança a ponto de acordar à noite e pensar em seu trabalho com satisfação trabalho para o qual você não teria vergonha de invocar a Musa. Assim Deus o ajudará, e só assim. Cada prego batido deveria ser como outro rebite na máquina do universo, sendo você o encarregado do trabalho.

Em vez de amor, dinheiro ou fama, dê-me a verdade. Sentei-me a uma mesa onde havia boa comida e vinho em abundância, e um público obsequioso, porém não havia sinceridade e verdade; e fui embora com fome dessa mesa pouco hospitaleira. A hospitalidade era fria como o gelo. Pensei que não haveria necessidade de gelo para esfriá-los ainda mais. Falaram-me sobre a idade do vinho e a fama da safra; mas eu pensava em um vinho mais antigo, mais novo, mais puro, em uma vindima gloriosa, que eles não tinham e não poderiam comprar.”

H. D. THOREAU

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